Nº 52 - Ano V - Abril de 2000


por Leo Beker-Gómez, de Marselha, França

"Voltei a Buenos Aires várias vezes, sempre em busca de mais tango. Continuei vendo e revendo os tradicionais shows para turistas e, depois deles, indo às milongas assistir àqueles mesmos bailarines fazendo seu verdadeiro tango.  Ainda não me bastava.  Passei a vaguear pela cidade, saindo do circuito turístico e enveredando por suas galerias subterrâneas, pelos seus arredores.  Nessas andanças fiz alguns amigos, conheci e convivi com muitas pessoas.  Dessa proximidade aprendi a perceber e sentir na carne e na alma um pouco do que representa o tango para aquele povo.  Para ele fluem todos os sentimentos do argentino, porém na sua maior intensidade.  No tango passei a reconhecer sentimentos humanos completamente nus,  despudorados, plenos, absolutos.  O amor de um homem por uma mulher é infinito, desesperado, passional, trágico; o amor à pátria, à terra natal, às cidades, aos bairros, às ruas é com todo fervor do ser humano; o amor aos pais, aos irmãos, à família, aos amigos é sincero e fervoroso; a reverência que dedicam àqueles que fizeram a história da nação, em geral, e a história do tango, em particular, é ímpar; a saudade é dolorida; toda dor é cantada e sofrida como uma chaga aberta; enfim todos os sentimentos cantados no tango o são na sua plenitude."

Este é um pequeno trecho do depoimento de mais uma amante do Tango, Regina Gentil Brasileiro, ao jornal Dance, ambos de São Paulo.

         

Cantemos...

 

(vals)

 Letra:  Homero Manzi Música:  Anibal Troilo

Primero la cita lejana de Abril, 

tu oscuro balcón, tu antiguo jardin,

más tarde las cartas de pulso febril

mintiendo que no, jurando que si.

Romance de barrio, tu amor y mi amor

primero un querer, después un dolor

por culpas que nunca tuvimos

por culpas que debimos sufrir los dos.

Hoy viviras despreciandome, tal vez sin pensar

que lamento al no poderte tener el dolor de no saber olvidar

hoy estaras como nunca lejos mio, lejos de tanto llorar...

Fue porque si, que el despecho te cegó como a mi

sin pensar que en el rencor del adiós 

castigabas con crueldad tu corazón,

fue porque si, que de pronto no supimos pensar

que es más facil renegar y partir que vivir sin olvidar.

Retornan vencidas tu voz y mi voz

trayendo al volver con tonos de horror

las culpas que nunca tuvimos,

las culpas que debimos pagar los dos.

 

Assim se tece a história

Anibal Troilo e seu bandoneón

Definindo Aníbal Troilo como músico:  era exímio bandoneonista, reúne em seu personalíssimo estilo, o modo de prodigiosa síntese, a delicada sonoridade de Pedro Maffia, a harmonia brilhante de Pedro Laurenz e o "fraseado em oitavas" de Ciriaco Ortiz.  Porém nunca se dirá o suficiente sobre Troilo, mas ainda há algo que Horácio Ferrer acrescentou, que o bandoneonista teria sido um apaixonado pelo flamenco.  Em outras palavras, como os guitarristas e cantaores dessa música andaluza, criava espontaneamente enquanto tocava.

Aníbal Carmelo Troilo nasceu em 1914, na porção de Almagro que chamam    El Abasto. Filho de cantor e guitarrista, ganhou logo o apelido Pichuco.  Em 1922, com a sua primeira comunhão veio também a primeira perda: a de seu pai.  Mas a vida continuava e aos 11 anos lhe deu a alegria de conhecer o instrumento que marcaria o seu destino:  havia dois guitarristas e um grego que tocava algo que o menino via pela primeira vez: o bandoneón.  Parou, como que enfeitiçado pelas notas que o homem tirava do instrumento.  Depois veio seu primeiro "fueye", que comprou em quatro prestações.  Juan Amendolaro, seu único professor de bandoneón, depois de seis meses chegou à seguinte conclusão: ou não havia mais nada a ensinar-lhe, ou seu aluno o havia superado.  E era verdade, o bandoneón era uma extensão sua e o som que Troilo dele arrancava saía-lhe da alma.

Já em 1925 integrava um quinteto cujo palco improvisado era um terreno do bairro. Pouco mais tarde, tocava profissionalmente musicalizando os filmes mudos do cinema Petit Colón.  Depois de ter integrado vários conjuntos famosos, chegou à sua própria típica, onde contava com dois bandoneonistas, três violinistas, um pianista, um contrabaixista e Francisco Fiorentino como cantor.  Além de executante e maestro, Troilo foi um compositor admirável, que produziu belos tangos - Toda mi vida, Pa' que bailen los muchachos, Garúa, Barrio de tango, Sur, La última curda, Te llaman malevo, Contrabajeando, A Pedro Maffia, milongas como La trampera, Com mi perro, Milonga de Manuel Flores, Con toda la voz que tengo e os valses Romance de barrio, Valsecito amigo etc.

Foi-se prematuramente em 18 de maio de 1974 - ou não, talvez ainda volte, porque, como ele mesmo assegurou: "alguien dijo una vez que you me fui de mi barrio.../ Cuándo...? Pero, cuándo?/ Si siempre estoy llegando".

(Trad. RM)

 

Voltar ao início