Impressões de um milongueiro...

 

                                   Depois de anos na estrada, longe do ambiente milonguero, a situação do país o permitiu e não perdi a oportunidade de assistir ao maestro no Teatro Colón (nosso Municipal).   Foi em 1985 e Pugliese cumpria 80 anos. Lá estava ele, com a música que herdou da escola de De Caro, incorporou um arranjo orquestral e trouxe dessa maneira um gênero de clara definição musical.

                                   Considero que Pugliese deu um ritmo ‘picado’ para se adaptar aos dançarinos que preferiam o popular do rey del compás: Juan D’Arienzo. Graças à bandoneonista Paquita Bernardo, que se apresentava no Bar Domínguez (Buenos Aires) foi que se conheceram dois dos maiores artistas de tango; eram eles os virtuosos Elvino Vardaró (violino) e Osvaldo Pugliese (piano).  Tinha a força do conjunto, numa autêntica superposição de planos sonoros e um fraseado fora do comum.  Às vezes nos bailes me perguntam: “qual o seu tango preferido?” Aí, respondo: "muitos!"  ... Porém, vamos escolher só três: Recuerdo, vigente desde 1924, depois La Yumba, tango precursor de outros tão maravilhosos e o terceiro, Negracha, uma obra ímpar.

                                   Quero comentar também dos seus grandes cantores. Então vamos de três: Maciel, Chanel e meu conhecido Alberto Morán.  Móran morava em Alsina (Buenos Aires) e os pais tinham um comércio.  Engraçado, porque cada vez que eu passava por ali havia um monte de mulheres na porta, aguardando para ver o “flaco” Móran.  Uma outra lembrança, esta sim, bárbara:  éramos oito amigos, todos milongueros.  Devo destacar que neste tempo éramos todos “hinchas” ou fanáticos de Morán y Pugliese. Os seguíamos a todo lugar.  Um destes amigos se chamava Hector Pita, que Deus o tenha, aliás, todos já se foram.  Este Hector era como um irmão para mim. Tinha uma irmã chamada Sara que era uma linda mujer. Estávamos tomando mate (chimarrão) quando a irmã apareceu e disse “chicos, tienen que irse...”.  Estranhei e perguntei ao meu amigo o que se passava com ela.  Ele me disse : “Não posso dizer, senão a minha irmã me mata”.  Às oito da noite Sara abre o portão e entra um carrão - e quem era? O “flaco” Morán!  Nossa, fiquei mudo com a surpresa!  Imaginem depois... Infernizamos a vida da Sara para podermos estar junto a ele.  Pena que durou pouco, só um ano.  E quem perdeu foi ele, porque Sara era maravilhosa.

                                   Poderia ficar falando de Pugliese o livro inteiro. 

 

Horácio

Rio de Janeiro, agosto/2011